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Quarta, 27 de Novembro de 2024

Secretária de Saúde acusada de racismo contra médica é afastada

25/03/2015

O prefeito de Santa Helena, no oeste do Paraná, decidiu afastar a secretária de Saúde, Terezinha Madalena Bottega, depois de denúncias feitas por uma médica do Programa Mais Médicos de que havia recebido comentários racistas sobre o penteado no estilo “dreadlock” que usa. A gaúcha Thatiane Santos da Silva, de 30 anos, relatou o caso ao Ministério da Saúde, que notificou a prefeitura a dar explicações no prazo de cinco dias.

De acordo com a médica, o comentário foi feito na quinta-feira (19) durante uma reunião para definir as estratégias de trabalho no Programa Saúde da Família. Constrangida com a abordagem da responsável pela pasta, Thatiane fez um Boletim de Ocorrência na sexta (20), encaminhou uma carta ao Ministério da Saúde (MS) e denunciou o caso ao Conselho Federal de Medicina (CFM).

“Assim que entrei na sala, ela, e a assistente, disseram que queriam falar comigo sobre um problema: o meu cabelo. De acordo com elas, os pacientes estavam acostumados com um padrão de médicos, como se fossem deuses, e que eu poderia encontrar dificuldades pelo preconceito que eles poderiam ter com meu cabelo”, lembrou. “Já trabalhei no Rio de Janeiro e no Rio Grande do Sul e em nenhum momento senti qualquer resistência quanto à maneira como me visto ou à cor da minha pele”, reforçou.

A decisão de afastamento foi publicada no Diário Oficial do Municipio. A portaria 70/2015 estabelece a abertura de uma sindicância especial para "a apuração, infração
legal e responsabilização, em relação aos fatos relativos a possível conduta discriminatória, no âmbito da Secretaria Municipal de Saúde". O prazo para a conclusão das investigações é de 15 dias. Até a publicação desta reportagem, o prefeito Jucerlei Sotoriva não havia sido encontrado para falar sobre o caso.

O caso
A clínica geral cursou medicina em Cuba, onde se formou em 2012. Em 2014, fez o Sistema de Revalidação de Diplomas Médicos (Revalida) na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) para obter o registro no Conselho Regional de Medicina (CRM) e poder atuar no Brasil. Ela chegou a Santa Helena no início de março e desde segunda-feira (23) está trabalhando no posto de saúde do bairro São Clemente.

“Com exceção da secretária e da assistente dela, fui muito bem recebida pelas pessoas. Não percebi esse problema que a senhora Terezinha insistiu em antecipar dizendo que estava pensando apenas em me proteger. Ela generalizou a população como se todos fossem preconceituosos e racistas. Cada um deve ser respeitado independentemente de seu cabelo, cor da pele, crenças ou escolhas pessoais. Estas características não podem interferir na qualidade profissional”, ressaltou a médica ao adiantar que uma comissão do Ministério da Saúde deve visitar a cidade na sexta-feira (27) para investigar o caso. “Abri mão da residência médica para trabalhar em Santa Helena e não quero sair daqui.”

Intenção de proteger
Nesta quarta-feira (25), Terezinha não foi encontrada para comentar o afastamento. Mas, na terça-feira, a secretária disse ao G1 que não teve a intenção de ser preconceituosa ao fazer o comentário sobre o estilo do cabelo da médica, mas apenas alertá-la sobre a possível reação de alguns pacientes. “Em nenhum momento quis ofendê-la. A intenção foi até protegê-la de uma eventual resistência ou comentário dos pacientes. Não teve nada a ver com cor da pele ou raça, foi com o cabelo dread, por causa do visual e do cheiro diferente que, em uma sala fechada, exala”, justificou.

“A conversa com ela foi tranquila. Ela me respondeu dizendo que estava preparada porque era militante, negra e mulher e que não mudaria o seu estilo. Na ocasião me desculpei e não imaginava que teria essa repercussão toda. Não deveria ter feito o comentário”, arrependeu-se a secretária. “Dos nove médicos do Mais Médicos que temos, oito são negros e, destes, quatro são cubanos. Por imaginar a resistência da população – a maioria de ascendência italiana e alemã – sempre tive esta preocupação com a integração. Para evitar os constrangimentos procurava levar os profissionais a encontros com a comunidade e outras atividades.”

Em nota, o Ministério da Saúde informou que a Coordenação Nacional do Mais Médicos já tomou conhecimento do caso e que deverá acompanhar a denúncia. "O município foi notificado na segunda-feira (23) para apuração dos fatos. Conforme preveem as regras do Programa, o gestor local tem o prazo de cinco dias para prestar esclarecimentos. Caso não seja apresentada justificativa dentro do prazo ou comprovada a irregularidade, o município estará sujeito a sanções do Ministério da Saúde, no âmbito do Programa Mais Médicos para o Brasil."

Por meio do comunicado, o MS também disse repudiar "veementemente todas as formas de discriminação étnico-racial, reconhecendo o preconceito como determinante social que impacta diretamente nas condições de saúde e de vida dos brasileiros" e orienta que denúncias podem ser feitas pelo Disque Saúde 136.

Segundo a assessoria de imprensa da prefeitura, a secretária recebeu a notificação do Ministério da Saúde no fim da tarde de terça e está preparando os esclarecimentos devidos.