Sindicato dos Aeroviários no Estado de São Paulo
Segunda, 25 de Novembro de 2024

O primeiro dia da mulher sambista

16/04/2019

Comemorou-se no fim de semana, com destaque para 13 de abril, aniversário de Dona Ivone Lara, o Dia da Mulher Sambista. É uma nova data festiva no calendário da cidade, criada ano passado por vereadores que se aliam à causa do empoderamento feminino ao som de surdos e tamborins.

Data festiva nunca é demais. O carioca, o brasileiro andam precisados de motivos para orgulhar-se de sua gente, tempo e lugar, nem que seja na música e no futebol. Dona Ivone Lara, que morreu ano passado, três dias depois de seu 96º aniversário, é bem o símbolo do papel da mulher no samba.

Nem todos sabem que alguns dos melhores criações cantadas nas rodas da Serrinha tinham música e letra dela, assinadas com ou por outros. Naqueles tempos, anos 50 ou mesmo 60, moça distinta podia dançar, cantar, desfilar por seu Império Serrano, mas não fazer samba. E Dona Ivone Lara, enfermeira de profissão, sempre foi moça distinta.

Mano Décio da Viola e Mestre Fuleiro, primo de Dona Ivone, estão entre os compositores que ganharam na quadra da escola, ou no disco, aplausos que deviam ser endereçados a ela. Até que, descoberta, sem perder a distinção, a moça teve a honra de fazer samba-enredo com o grande Silas de Oliveira e, a partir daí, ganhar o mundo como mulher sambista.

A nova data, comemorada este ano pela primeira vez, é motivo para que se pense no papel que a mulher representa, não só no samba, mas em toda a música popular.

E não só no Brasil, mas em toda parte. Mesmo nos países em que há registro de boas e famosas compositores (a França de Marguerite Monnot, o México de Consuelo Velásquez, a América de Kay Swift), são elas as exceções de uma regra segundo a qual a mulher só se destacava como intérprete.

Na música clássica, menos ainda. Óperas escritas por mulher, quantas? Sinfonias, concertos, quantos? O talento feminino só se mostrava no canto dos sopranos e contraltos, ou nos dedos das admiráveis solistas de piano e violino.

No Brasil, antes que o samba ganhasse status de “música nacional”, Chiquinha Gonzaga foi a exceção, a figura isolada, assim mesmo graças a uma personalidade forte, corajosa, pioneira, que a permitiu brilhar entre os homens, mas não tanto quanto, depois dela, Carmen Miranda, a intérprete.

Parece haver uma espécie de queixa a ser superada – entre outras coisas, pela data a festejar – quanto ao papel secundário que a mulher sempre representou no samba, antes de Dona Ivone Lara entrar em cena. Até uma tese de mestrado se anuncia para discutir o assunto.

Só não se deve esquecer que o espaço que o samba negou à mulher em mais de um século é o mesmo que, para dano da História, o mundo vem negando a mulher desde sempre.